“Temos o rei do futebol, as rainhas de bateria… O povo daqui gosta de glamour e de exuberância.” Com esses e outros argumentos, digamos assim, nem um pouco nobres, o descendente mais combativo da casa imperial brasileira faz uma campanha árdua e inglória para tentar recolocar a família no trono. Bisneto da princesa Isabel, terceiro na linha de sucessão caso o país ainda fosse uma monarquia e autoproclamado Príncipe Imperial do Brasil, dom Bertrand Maria José Pio Miguel Gabriel Rafael Gonzaga de Orleans e Bragança e Wittelsbach, de 72 anos, parece ter em comum com os antepassados apenas o nome comprido.
Ele mora como um plebeu em uma casa alugada no bairro do Pacaembu. Na garagem, em vez de uma reluzente carruagem, há um Toyota Corolla 2009. Sai de lá com frequência para defender o retorno da coroa em palestras. Comparece a cerca de 100 eventos desse tipo por ano em faculdades, igrejas e, principalmente, em reuniões promovidas por simpatizantes da causa. Mesmo que ela soe deslocada no espaço e na época, dom Bertrand confia na volta aos velhos tempos. “Nossa índole não é republicana”, acredita.
Nascido em Mandelieu, na Riviera Francesa, ele é o terceiro de doze filhos. Mudou-se para o Rio de Janeiro aos 5 anos de idade, e logo em seguida seu pai comprou uma fazenda em Jacarezinho, no Paraná, onde plantava café e criava gado. Aos 18, instalou-se em São Paulo para cursar direito no Largo São Francisco. Seu registro na OAB é o de número 41 060, mas ele jamais exerceu a profissão. Também nunca se casou nem teve filhos. “Fiz a escolha de ter essa vida em prol da minha luta”, justifica.
O príncipe do Pacaembu mora com seu irmão mais velho, dom Luiz, o primeiro na linha de sucessão (veja o quadro). A residência de dois andares tem quadros com gravuras do primeiro imperador e da princesa Maria Leopoldina, além de uma espada com acabamento de ouro que pertenceu a dom Pedro II. O sustento de dom Bertrand vem de doações de voluntários à causa monárquica. “Aceitamos qualquer colabora-ção, seja ela de 50 reais ou mais”, afirma. Ao todo, segundo seus cálculos, cerca de 120 pessoas depositam todo mês uma ajuda financeira. Para as doações esporádicas, ele tem uma máquina de cartão de crédito.
Fora a monarquia, o assunto que mais o empolga é a temperatura do planeta. Dom Bertrand está longe de fazer a linha de “príncipe ecológico”. Muito pelo contrário. Sua batalha é tentar convencer as pessoas de que o aquecimento global é uma teoria da conspiração de “ecoterroristas”, cujos objetivos são impedir o livre-comércio e impor a reforma agrária. Esses argumentos são defendidos em seu livro, Psicose Ambientalista, lançado em outubro de 2012 pela editora Petrus.
Ao todo, foram vendidos 19 000 exemplares da obra, financiada, em sua maior parte, por amigos fazendeiros. O descendente da monarquia portuguesa afirma que os “vermelhos” são os novos “verdes”. “O MST queria a propriedade dos agricultores, mas agora só fala de sustentabilidade.”
Dom Bertrand afirma ter pesquisado em livros e estudos técnicos para escrever seu trabalho polêmico. “O mundo é cíclico, a região que hoje está quente pode estar fria amanhã”, defende. Em agosto do ano passado, ele compareceu ao câmpus da Unesp em Franca para debater o assunto. Ao entrar, recebeu tantos gritos e vaias dos alunos que a conversa precisou ser transferida para outro lugar. “Era um bando de esquerdistas e de drogados”, justifica o príncipe, um antigo membro da ultraconservadora Sociedade Brasileira de Defesa da Tradição, Família e Propriedade, a TFP.
Os pretendentes ao trono: Quem está na linha dianteira da sucessão da monarquia brasileira
Luiz Gastão Maria José Pio Miguel Gabriel Rafael Gonzaga de Orleans e Bragança e Wittelsbach: ocupa o cargo de chefe da casa imperial brasileira por ser o primogênito da família. Nasceu na cidade francesa de Mandelieu e se formou em química na Universidade de Munique, na Alemanha. Tem 74 anos, nunca se casou e mora em uma casa no Pacaembu junto com o irmão dom Bertrand.
Eudes Maria Rainier Pedro José Miguel Gabriel Rafael Gonzaga de Orleans e Bragança e Wittelsbach: segundo nome na linha de sucessão, é oficial da Marinha reformado e mora no Rio de Janeiro. Casou-se duas vezes e tem seis filhos, alguns dos quais moram em São Paulo. Está com 73 anos.