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OLÁ,

Batatas fritas

Por Walcyr Carrasco
Atualizado em 5 dez 2016, 18h21 - Publicado em 7 jan 2011, 17h03

Sempre prometo a mim mesmo fugir das batatas fritas. É uma constante intenção de Ano-Novo, quando, de olhos culpados diante do espelho, resolvo eliminar os alimentos gordurosos. Durante os dias, semanas e meses seguintes, fortaleço minha decisão: adeus, batatas fritas! Basta um minuto para a derrocada. No restaurante, abro o cardápio e pergunto, como se não soubesse:

— O que acompanha o filé?

— Fritas. Mas, se quiser, posso trocar por legumes cozidos — afirma o maître.

Quem nesta terra prefere uma porção de legumes às infernais fritas? Digo a mim mesmo: “Só desta vez”.

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— Pode ser com fritas mesmo.

Tudo falsidade. Nem faço questão do filé. Quero as delícias crocantes. Quando chegam, me atiro sobre elas. Como com as mãos. Há coisa mais deliciosa do que pegar as batatinhas com os dedos, esquecendo o garfo e os manuais de boas maneiras?

Qual o segredo das batatas fritas? Como se tornaram um dos nossos prazeres mais culposos? Acredita-se que tenham sido criadas na França, pátria do colesterol. Há um livro de receitas, “Les Soupers de La Cour”, de 1758, que já menciona as safadas. Para corroborar a origem, em inglês fala-se de “french fries”. Mas um historiador, Jo Gerard, afirma que em 1681 já se fritavam batatas na região da atual Bélgica. A Espanha também reivindica a primazia. As primeiras batatas teriam sido fritas por ninguém menos que Santa Tereza d’Ávila. Humm… se a santa pode, por que eu não posso?

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Durante séculos comeram-se as batatas inocentemente. Mas vivemos sob o jugo das descobertas médicas. Tornaram-se perigosíssimas, por causa do alto índice de gordura. Atualmente, diante de uma porção de fritas, penso horrorizado em colesterol, obesidade e nos cavaleiros do Apocalipse! Mas hambúrguer sem fritas, impossível! Filé, chope? Quando estive na Inglaterra, no ano passado, um amigo inglês me apresentou o prato típico: fish and chips. Ou seja, uma espécie de peixe à milanesa com batatas fritas. Encontra-se em qualquer restaurante, por mais simples que seja, a preços módicos. Durante a semana em que estive por lá, devorei dezenas de peixes e quilos de batata. Antes só botava mostarda e ketchup. Na Inglaterra, descobri que ficam deliciosas com vinagre. Ganhei uns 3 quilos de barriga e uma tonelada de culpa.

— Ó, por que me rendi às batatas fritas? — gemo, quando tento fechar o botão rebelde do umbigo do último paletó que talvez me sirva.

Mas no fundo sinto uma pontada de prazer. O que seria da vida sem batata frita?

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Vários restaurantes franceses de São Paulo oferecem outra variável: mexilhões com fritas. Perguntei-me:

— Será que combinam?

Pedi e me maravilhei. Nasceram um para o outro!

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A batata frita já produziu descendência, tão engordativa quanto a original. Falo das “potato chips”. Aquelas que vêm em saquinhos, bem fininhas, fritinhas e crocantes. Quem nunca entrou num hotel, abriu o frigobar e devorou um saquinho inteiro antes do jantar? Salgadinhas, deliciosas e traiçoeiras, sempre prontas para dar o bote no regime! Soube que surgiram em um restaurante de Nova York, quando o cliente devolveu seu prato de batatas por estarem muito grossas. O chef, irritado, cortou-as em lâminas e as atirou novamente na frigideira. Fininhas e crocantes, fizeram história. Eu confesso: se abro um saquinho de chips, devoro até o final. E pronto.

Neste ano me poupei de promessas que não vou cumprir. Pretendo aproveitar os pequenos prazeres da vida. Que venham as fritas! Abaixo a culpa!

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