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Após condenação de ex-namorado, mãe de Sophia retoma rotina

“A prisão dele não vai aliviar minha dor, mas um crime assim, não poderia ficaria impune", diz Lígia Cancio, mãe da menina de 4 anos asfixiada pelo pai

Por Ana Carolina Soares
Atualizado em 5 fev 2018, 20h05 - Publicado em 5 fev 2018, 19h44
Meses antes da tragédia, Sophia comemorou o aniversário do avô: apartamento onde a família morava segue fechado (Reprodução Facebook/Veja SP)
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Em São Miguel Arcanjo, cidade paulista a 180 quilômetros da capital, a família Kissajikian Cancio se prepara para retomar a rotina, após dois anos e um mês de apreensão. Eles aguardavam o julgamento de Ricardo Najjar, autônomo de 25 anos, ex-namorado da estudante de Direito Lígia Cancio, da mesma idade. Najjar foi incriminado pelo Ministério Público por matar a filha do casal, Sophia, de 4 anos, por asfixia no apartamento dele, no Jabaquara, em 2015. Por volta das 3h da manhã da quinta (1º) saiu a sentença no Fórum Criminal da Barra Funda, do júri popular: por quatro votos e a três, ele foi condenado a 24 anos e dez meses por homicídio doloso, quando há intenção de matar.

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Ricardo Najjar durante julgamento: condenado a 24 anos e dez meses de prisão (Reprodução TV/Veja SP)

Agora, Lígia pretende retomar seu cotidiano aqui na capital. Em março de 2016, quatro meses após a tragédia, ela resolveu viajar por diversos países da América Latina e do Oriente Médio. Queria se afastar das lembranças do crime. Trabalhava como atendente de lojas e também fazia ações  voluntárias, cuidando de crianças refugiadas. No fim do ano passado, ela voltou a São Paulo, para se preparar para o julgamento.

Após a sentença do ex-namorado, passa uma temporada na casa de sua irmã mais velha, a especialista em gestão ambiental Stéfanie Kissajikian Cancio, em São Miguel Arcanjo. Tímida, a mãe de Sophia está ainda mais reclusa, não usa as redes sociais e só atende telefonemas dos familiares. Mas no próximo mês, ela deverá procurar um apartamento na capital. Em 2018, ela quer retomar os estudos, interrompidos no 4º ano da faculdade de Direito. Além disso, busca um trabalho humanitário, de preferência, destinado a mulheres e crianças vítimas de violência doméstica.

Aos amigos, diz que ainda sente a presença da filha todos os dias, afirma que nunca conseguirá superar a tragédia, mas deseja um dia formar uma família. Desde o pai de sua filha, Lígia não se envolveu em nenhum outro relacionamento amoroso. Mas sonha um dia casar e ter filhos.

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Apesar da condenação, o julgamento “reabriu feridas profundas” em Lígia. Ela se abalava cada vez que ouvia no tribunal frases como “a condenação de Ricardo não irá trazer Sophia de volta”. Em entrevista a VEJA SÃO PAULO uma semana antes do julgamento, a mãe da menina declarou: “A prisão dele não vai mudar minha vida, não vai aliviar minha dor, nem da minha família. Mas um crime assim, tão cruel, e ainda contra uma criança, não pode ser esquecido e jamais ficar impune.”

Outro ponto delicado foi relembrar detalhes da tragédia durante o julgamento. A gravidez de Sophia aconteceu logo no segundo mês de namoro. Na época, os dois tinham 18 anos. Lígia e Najjar tiveram medo na época e os dois cogitaram o aborto. Três meses antes de dar à luz, a estudante (que é a caçula de uma família com três filhas) enfim revelou aos pais sobre a gravidez. A psicóloga Elisabete Kissajikian e o administrador e empresas Vitor Cancio acolheram o jovem casal. Os então adolescentes e a bebê ganharam um quarto no apartamento de classe média alta, na Vila Mariana. Mas o relacionamento terminou quatro meses depois do nascimento de Sophia. “Além de ter tirado a vida do maior amor da minha vida, Ricardo desestabilizou completamente a vida dos meus pais, das minhas irmãs, sobrinhos e de todos que nos cercam”, diz Lígia.

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A mãe, a estudante de Direito Lígia Cancio, com a filha dias antes da tragédia (Reprodução/Veja SP)
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A família mantém fechado o imóvel de três quartos, na Vila Mariana. Em março de 2016, mesma época que Lígia decidiu viajar pelo mundo, os pais dela decidiram se mudar para São Miguel Arcanjo, para a casa da filha mais velha, Stéfanie. Lá, frequentam uma igreja evangélica e levam uma rotina tranquila, de poucos compromissos. “Desmontamos o quarto de Sophia, mas o resto segue igual. Não tivemos mais coragem de voltar ao apartamento”, conta a irmã de Lígia.

Stéfanie tem cuidado dos pais, da irmã caçula e também dá notícia da família aos amigos, via redes sociais. “Seguimos agora com a consciência de que um homem assassinou a própria filha e foi condenado finalmente pelo povo”, diz a irmã de Lígia. “Ricardo teve seus direitos garantidos com uma ótima bancada de defesa. Mas Sophia? Que direitos ela teve?”, diz. Religiosa, a família confia na “justiça divina” e cita nas redes sociais trechos da Bíblia, com fotos de Sophia.

A menina ganhou uma página em sua homenagem no Facebook e conta com quase 6 000 curtidas. Stéfanie, a tia, retribuiu a força dos amigos com um post: “Agradeço a todos que caminharam conosco para que este dia chegasse. A memória da pequena está em nossos corações com carinho, como este singelo beijinho.”

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Foto da menina usada em post em homenagem da tia (Reprodução Facebook/Veja SP)

Batalha judicial prossegue

Apesar da condenação na semana passada, a batalha judicial continuará. “Nesta semana, vou apelar para o Tribunal de Justiça e pedir a anulação do júri”, diz Antonio Ruiz Filho, advogado do réu. “Sophia morreu por causa de um acidente doméstico e houve contradição entre os jurados”, afirma.

Por ora, Najjar está no Centro de Detenção Provisória, em Pinheiros. Até o fim desta semana, deverá voltar à penitenciária Dr José Augusto César Salgado, em Tremembé II, a 160 quilômetros da capital. Ali estão detentos envolvidos em casos de grande repercussão nacional. Um dos colegas de Najjar, por exemplo, é Alexandre Nardoni, sentenciado a trinta anos pelo assassinato de sua filha Isabella, de 5 anos, em 2008. Em Tremembé, Najjar trabalha na cozinha. “Ele pode manusear facas, um privilégio para presos de baixa periculosidade”, diz o advogado de defesa.

A equipe da acusação não acredita que Najjar possa ser solto ou ter um novo julgamento. “Dificilmente esse julgamento será anulado, pois a decisão não é contrária a prova dos autos”, diz Alberto Zacharias Toron, advogado assistente de acusação.

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