Das recepções comandadas pelo costureiro francês Paul Poiret (que o levaram à bancarrota, segundo a língua ferina de sua rival Coco Chanel) àquelas oferecidas pelos barões de Rothschild, o século XX foi uma festa. A fantasia. Seguidores de uma moda lançada nos salões do Palácio de Versalhes pelo rei Luís XIV três séculos antes, anfitriões da alta sociedade investiam seu tempo (e muito dinheiro) na organização de bailes temáticos. “Desde o tempo do Rei Sol se gastava em excesso para garantir a característica principal desses bailes: fundir realidade e ficção”, diz o jornalista e historiador inglês Nicholas Foulkes, autor de “Bals, Legendary Costume Balls of the Twentieth Century”. Recém-publicado em Nova York, “Bailes, Festas Lendárias a Fantasia do Século XX”, em tradução livre, reconta nove desses bailes lendários, realizados entre 1903 e 1971 — com 308 páginas e mais de 250 imagens, custa 175 dólares e está disponível no site da Editora Assouline (assouline.com).
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Todos os bailes exigiam dos convidados um figurino inspirado num personagem histórico ou da literatura. Exigiam mesmo. Quem desobedeceu ao dress code na noite de 24 de junho de 1911, por exemplo, teve duas opções na entrada: vestir uma das criações orientais de Poiret ou subir na carruagem e voltar para casa. “Havia um senso de espetáculo nessas festas, que viraram uma vitrine para o trabalho dos melhores costureiros, decoradores, músicos e joalheiros do mundo”, resume Foulkes.
O livro serve de prefácio para entender a mais nova coleção da Van Cleef & Arpels, cujas peças foram exibidas por várias convidadas dessas festas. A grife aterrissa por aqui em março, com uma loja no futuro Shopping JK Iguatemi. Batizada de Bals de Légende (“Bailes Lendários”), a linha pertence ao universo da alta joalheria, o equivalente da alta-costura no mundo das pedras e dos metais preciosos. Desde 1906, a maison do número 22 da Praça Vendôme, em Paris, escolhe temas grandiosos para criar peças extraordinárias em todos os sentidos — as pedras são únicas, e os desenhos, lúdicos. É o caso das baleias, golfinhos, elefantes e balões tirados dos livros “Vinte Mil Léguas Submarinas e Viagem ao Centro da Terra”, de Júlio Verne, da coleção lançada no ano passado. “Não criamos limitados pelo formato ou pela cor de uma pedra”, diz Nicolas Bos, que acumula a função de diretor dos ateliês e presidente da grife para as Américas. “Buscamos o movimento e queremos que cada item conte um conto de fadas.”
Na Bals de Légende, cinco entre os nove bailes recapitulados por Foulkes são a desculpa perfeita para diamantes, safiras multicoloridas, pérolas, ônix e turquesa colorirem bailarinas, pássaros, leques, máscaras e serpentes. Entre as pedras únicas encontra- se uma esmeralda colombiana lapidada em cabochon, com 20,12 quilates — a “cereja” de um anel que integra a mais antiga referência da coleção: o Baile do Palácio de Inverno, oferecido pela czarina Alexandra, em 11 de fevereiro de 1903, para celebrar a Rússia do século XVII. Uma safira azul de 25,15 quilates, do Sri Lanka, coroa um anel da linha Baile do Século, nome da festa oferecida em 3 de setembro de 1951 pelo biliardário Carlos de Beistegui para relembrar a Veneza setecentista.
A última coleção retoma o Baile Proust, quando 800 convidados se vestiram como um dos quase 2.000 personagens distribuídos em sete volumes de “Em Busca do Tempo Perdido”. Foulkes afirma que a festa inspirada na obra-prima do escritor francês, realizada em 2 de dezembro de 1971, no Château de Ferrières, no interior da França, foi a derradeira de um estilo de vida. A julgar pela coleção da Van Cleef, este é o momento de os convites começarem a chegar.